Aí você pára e pensa: será mesmo que gostaria de mudar alguma coisa? Tirar uma linha dessa história doida, doída, sentida, sem sentido? Será que se, realmente, você pudesse mudar alguns fatos, desfazer algumas coisas, você faria? Será que um simples ato que tivesse sido cometido de outra maneira, mudaria a ordem e a dor dos fatos de hoje?
Será que você trocaria tudo o que é por aquilo que gostaria de ser? Não, não é?
Quando a gente é pequeno, a gente teima em idealizar (mesmo que nem conheça essa palavra direito) a família perfeita. Você pega todos os defeitos da mãe, do pai, dos irmãos, dos tios e primos e simplesmente sonha que se você pudesse re-criar um novo cenário e enredo para a sua vida, você jogaria todos esses defeitos fora e viveria, por exemplo, numa casa onde todos torcem para o mesmo time, onde você pode tomar coca e comer chocolate o tempo que quiser, onde você possa não brigar com aquela sua prima que teima em usar o vestido igual ao seu na virada do ano novo e depois inventa que você falou mal dela e por aí vai. Você sonha com um lugar perfeito. Sem altos ou baixos, apenas uma trilha reta, sem voltas, curvas ou obstáculos.
Mas, no fundo, você sabe que isso é impossível. Então, você torce para que quando você crescer, você encontre algo perfeito. Que você aprenda a viver perfeitamente e que não repita os erros cometidos no passado.
Aí você cresce. Você vive tudo novo, de novo. E nada é aquilo que você sonha, nada é aquilo que você espera. É tudo muito mais. Muito mais intenso, muito mais sincero, muito mais real, muito mais bonito até, muito mais feio e podre também, muito mais tanta coisa que você já nem consegue entender.
Você estuda, dá o melhor de si para ser uma boa pessoa, começa a conhecer novas pessoas, viaja para lugares bonitos, vive intensamente cada dia.
Depois de muito tempo (ou nem tanto assim) você lembra de todos os sonhos que você tinha, de toda a família que você sempre idealizou e daquela que você realmente teve. Lembra que todos os momentos que passou com sua mãe são fantásticos e que quando você tiver uma filha quer dar o nome cheio de graça para ela e deseja que ela seja aquela que traga felicidade, assim como você foi a princesa que um dia nasceu e brilhou na vida de um casal apaixonado. Lembra que, juntamente com seu irmão chato, você construiu castelos de caixinhas de perfumes e cabanas e palácios de cobertas, edredons e afins. Lembra que com a irmã de cabelos cacheados lindos, você brincou de contar estrelas, você arrumou mil apetrechos para enfeitar as madeixas e por aí vai. Lembra que, depois de um tempão, Deus deu a oportunidade de vocês escolherem aquele que seria um mega-ultra-super irmãozinho do coração. Depois de todas essas memórias e outras tantas... Você vê que, com certeza, a família real e cheia de defeitos é bem melhor do que a ideal.
Quando você cresce o bastante para poder querer construir uma nova família (aquela que será ‘sua’, que você construirá junto com alguém que escolheu para amar). Junto com aquele menino bonito que você escolheu e deixou-se ser escolhida para amar, vem uma bagagem muito importante. Vem um sorriso bonito no cantinho da boca e mais diversas coisas bobas e sérias: palavras sussurradas ao pé do ouvido, conversas por horas na madrugada, declarações e confissões de tudo (ou quase tudo) que ele já foi e fez nessa vida, lembranças de um passado sentido. Ele conta para você todas as coisas verdadeiramente marcantes da vida dele.
Ele sempre foi o preferidinho da avó que preparava para ele miojo, hambúrguer, bolinho de chuva e arroz à grega. Ele lembra das saídas fantásticas que fazia com o pai pelas ruas da cidade de São Paulo e na voz dele, você percebe uma certa nostalgia, um clima de saudade daquilo que um dia ele foi e uma vontade enorme de constituir uma família bendida. Ele te conta que não parece quase nada com a mãe, pelo menos não fisicamente, mas que ele a admira com toda a força que tem e não entende o porquê de tanta coisa que aconteceu, mas o coração dele é bom e ele ama a mãe incondicionalmente e que ele quer ter um pouco da garra que ela tem um dia, aliás ele se acha bem parecido com ela nesse aspecto. Ele fala da irmã linda, com personalidade forte tanto quanto a dele, mas, ao mesmo tempo bem diferente dele, mas, ainda assim, muito especial e amada e mãe de duas crianças fantásticas. Um menino sapeca demais que, sim, precisa de uns puxõezinhos de orelha, vez em quando e quase sempre, mas dono de uma inteligência fantástica; uma menininha danada, moleca, levada da breca, com um nome forte, com lábios carnudos, com cabelos lisos e cachichos nas pontas, com sorriso gostoso e cheirinho delicioso.
Ele lembra, com uma emoção enorme, daquele dia na torre... A vez em que abraçou com tanta força e aliviou o choro daquela que é não é irmã de sangue dele, mas que ele considera muito chegada e quase como uma irmã por opção mesmo.
Ele conta as histórias com um quê de realismo fantástico do avô que já quase matou patrão com a peixeira e por aí vai...
Lembra e compartilha com você esses momentos vividos num quintal mágico e cheio de fantasias mas, ao mesmo tempo, muito sério e sincero, sentido e real... Um quintal que hoje já não mais abriga os sonhos e tantas coisas bonitas do passado, mas que ele ainda acredita que será um palco para as outras mil gerações. Você já se sente parte dele, literalmente. Ele conta para você os detalhes da trajetória confusa e complexa que seguiu até hoje e que, inevitavelmente, você começa a admirar e tentar entender, mesmo que seja muito, mas muito difícil. Mas aí você lembra que entender é muito pequeno e que não vale a pena perder o encanto de certas coisas, mesmo que isso pareça fantasioso demais.
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3 comentários:
A vida sempre acaba nos encaixando e nos mostrando como as coisas funcionam de um modo ou de outro, mesmo que essas coisas (ou algumas delas) já tenham se passado. Vai entender. Beijos amiga, você é especial e escreve "lindamente".
Lembrar é sempre bom!
Principalmente as coisas boas! rsrs. As ruins também são importantes, para evitar repeti-las ou previnir outras situações semelhantes. Lição amarga vivida, é lição apreendida, já tentava dizer Nietzsche com outras palavras. //
Crescer é saber distingüir do ideal do real, a utopia do caos, o sonho da realidade, sem entretanto deixar de sonhar, buscar o ideal e organizar o caos. //
Viver de passado é loucura. Reconhecer o passado como parte de nosso presente é condição primordial para se contruir um futuro a partir do agora. //
Fiquem bem! Deixem sem! Sigam além!
Sobre Borboletas, me vem à mente:
Saudade, palavra triste
Quando se perde um grande amor
Na estrada longa da vida
Eu vou chorando a minha dor
Igual uma BORBOLETA
Vagando triste por sobre a flor
Seu nome, sempre em meus lábios
Irei chamando por onde for
Você nem sequer se lembra
De ouvir a voz desse sofredor
Que implora por seu carinho
Só um pouquinho do seu amor
Meu primeiro amor
Tão cedo acabou
Só a dor deixou nesse peito meu
Meu primeiro amor
Foi como uma flor
Que desabrochou e logo morreu
Nessa solidão
Sem ter alegria o que me alivia
São meus tristes ais
São prantos de dor
Que dos olhos caem
É porque bem sei
Quem eu tanto amei
Não verei jamais
http://letras.terra.com.br/nara-leao/929310/
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